A OBRA DE PAULO SETÚBAL
IALMAR PIO
SCHNEIDER
Escritor elegante, poeta de a Alma Cabocla (poesias), romancista histórico de O Príncipe de Nassau, e A Marquesa de Santos (considerada sua
obra-prima, com tradução em vários idiomas), além de outros, num total de 13
livros, e as suas memórias de o Confiteor
(sua autobiografia, que foi publicada postumamente), Paulo Setúbal, foi um
autor que conheci nos idos de 1957, quando cursava o ginásio. Logo me atraíram
suas poesias, de cunho ultra-romântico, em que falava de sua terra natal Tatuí,
interior do Estado de São Paulo, amores diversos da juventude (moita de rosas, floco de espuma, sertanejas e poesia inédita), imprimindo a
seguinte dedicatória no seu livro de versos: “A ti, minha mãe, que és a melhor das mães, estes despretensiosos versos
da nossa terra e da nossa gente.”
Depois enveredou para a prosa, tendo produzido romances, contos
históricos, memórias, crônicas, episódios históricos e ensaios, que o levaram à
Academia Brasileira de Letras em 1934, com apenas 41 anos de idade, pois
nascera em 1893. Na ocasião pronunciou sincero discurso que arrematava com as
seguintes palavras de agradecimento: - “Mas
deixai também, meus senhores, que nesta linda hora risonha, em que as emoções
mais íntimas se atropelam dentro de mim, deixai que, mal acabe de vos
agradecer, eu me ausente precipitado destas galas. Sim, deixai que o meu
coração voe para longe daqui, fuja para a minha estremecida cidade de São
Paulo, e lá, comovido e respeitoso, penetre por um momento, muito de manso,
numa casa modesta de bairro sem luxo. Nessa casa, a estas horas, nesta mesma
noite, está uma velha toda branca, oitenta anos, corcovada, com o seu rosário
de contas já gastas, a rezar diante da Virgem pelo filho acadêmico. Pelo filho
que ela, a viúva corajosa, ramo desajudado, mas altaneiro, de família opulenta,
criou, educou, fez homem - Deus sabe com que sacrifícios e com que ingentes
heroísmos obscuros ! Deixai pois,
senhores acadêmicos, que o meu coração voe para a casa modesta de bairro sem luxo,
entre no quarto do oratório, ajoelhe-se diante da velha branquinha, beije-lhe
as mãos, e, na brilhante noite engalanada deste triunfo, diga-lhe por entre
lágrimas: - Minha mãe, Deus lhe pague !” Três anos após, entretanto,
faleceria, em 1937, interrompendo uma trajetória literária promissora e recebeu
do P. Leonel Franca S. J., o exórdio: PAULO
SETÚBAL ! “Na plenitude dos anos, o anjo da morte bateu-lhe à porta para
acompanhá-lo ao descanso eterno dos justos. Os admiradores da sua obra
literária lamentam, inconsoláveis, o desaparecimento prematuro do artista da
palavra. No firmamento das letras foi o seu brilho fugaz como o de um meteoro.
Os que, nos últimos tempos, lhe conheceram de perto as ascensões espirituais
choram a perda irreparável de um apóstolo cujas irradiações benéficas poderiam
amanhã estender-se em ondas de incomensurável amplitude.”
Apesar da glória que atingiu em tão
pouco tempo, para mim será sempre o poeta de versos simples quais os que se
seguem: “SÓ TU - Dos lábios que me
beijaram,/ Dos braços que me abraçaram,/ Já não me lembro, nem sei.../ São
tantas as que me amaram !/ São tantas as que eu amei !// Mas tu - que rude
contraste ! - / Tu, que jamais de beijaste,/ Tu, que jamais abracei,/ Só tu,
nest’alma, ficaste,/ De todas as que eu amei...”
E destes outros que decorei, em certo
tempo de minha vida, na adolescência, e sempre me pediam que declamasse, em
festinhas que freqüentava, onde correu um boato que eu havia me apaixonado por
uma noiva, ou melhor, seria apaixonado por alguém que agora seria noiva. Devo
dizer que não passa de lenda, embora não seja tão famoso assim. Lá vai: “SÊ FELIZ ! -
És noiva... Em breve há de raiar o dia,/ Festivo, azul, vibrante de
alegria,/ Que te sorri num céu de rosicler./ Irás à igreja. E, num altar formoso,/
Branca de anseio, trêmula de gozo,/ Verás florir teu sonho de mulher !//
Oh! Nessa noite, o baile terminado,/ Ao
te despires para o teu noivado,/ Sonhando os sonhos que a paixão te diz,/ Tu
hás de ouvir, na alcova silenciosa,/ O tom queixoso duma voz queixosa,/ Que te
dirá baixinho: Sê feliz !// E, pálida de susto, ao escutá-la,/ Hás de
reconhecer a minha fala,/ Ouvindo a minha voz naquela voz !/ E hás de sentir,
como jamais sentiste,/ O fel que vai naquele verso triste,/ A dor que punge
aquela frase atroz...
Só para complementar, esses dias,
passei por um dos “becos dos livros”, e adquiri a obra completa de Paulo
Setúbal, edição Saraiva, de 1954, em perfeito estado de conservação, para não
dizer novos. Acredito que nem tenham sido abertos e folheados. São treze
volumes que pretendo ler aos poucos, como quem curte uma saudade de um tempo
bom de outrora. Contava com menos de dezoito invernos e talvez era feliz sem
saber. A vida é assim mesmo...
_______________________________
Cronista
e poeta
Publicado em 26 de junho de 2002 - no Diário
de Canoas.
EM 26.04.2010
em 4.5.2011