sexta-feira, 15 de outubro de 2010

CRÔNICA de IALMAR PIO - IMAGENS da INTERNET

Pelicano



Alfred de Musset










O POETA E O PELICANO

IALMAR PIO SCHNEIDER

Estava eu a matutar no que iria escrever nestas horas monótonas de minha vida, quando me deparei com uma poesia da época romântica francesa que traduzimos na adolescência, ao cursarmos o Científico. Lembro-me que o professor de francês no Colégio Nossa Senhora da Conceição de Passo Fundo - RS, era o irmão marista Érico, cujo apelido carinhoso era “Foquinha”, e que ao ler as poesias em voz alta ele se empolgava transmitindo uma emoção ímpar e que todos ouvíamos em silêncio, no original desta língua tão melódica quanto sonora, no meu mero entendimento. O livro em que estudávamos era o Cours de Français, de Augusto R. Rainha e José A. Gonçalves, e nas páginas 35, 36 e 37, constava a minibiografia do autor e a poesia a que me refiro, como segue: “Época Romântica - A Poesia - MUSSET (1810-1957) - 1 - Alfred de Musset nasceu em Paris, onde após excelentes estudos, partiu do Cenáculo e se engajou no romantismo. Entretanto, não tardou a retomar uma independência da qual era cioso (ciumento). Levou, durante algum tempo, uma vida licenciosa que lhe não deixa senão remorso e desencantamento. Tornou-se então um poeta apaixonado. É o período de sua grande poesia.
Este poeta tão grande e tão maravilhoso, é Enfant du siècle (Filho do século), como ele gostava de se chamar a si mesmo, e morreu na idade de quarenta e sete anos.
2 - Suas Obras Líricas estão reunidas em dois volumes: Primeiras Poesias (Contos da Espanha e da Itália); Novas Poesias (as Noites), a melhor parte da obra do poeta. - 3 - Musset é antes de tudo o “poeta do amor”. É seu princípio que “toda a obra literária consiste em abrir seu coração e a penetrar no coração do leitor”. “Ah ! bate de encontro ao teu coração: é lá que está o gênio” - escreveu. É um poeta todo pessoal (original), não gostava de imitar: “Mon verre n’est pas grand, mais je bois dans mon verre.” (Meu copo não é grande, mas eu bebo no meu copo).”
Após este prólogo tão interessante quanto necessário, a meu ver, em tradução minha adaptada, vamos à poesia: “O PELICANO - Qualquer preocupação que sofras em tua vida,/ Oh! deixa dilatar-se, esta santa ferida/ Que os negros serafins têm cavado em teu peito/ Nada nos faz tão grandes como um sofrer perfeito./ Mas, por estar atento, não creias, ó poeta,/ Que no Mundo a tua voz deva ficar quieta !/ Os mais pungentes são os cânticos mais belos,/ E eu conheço imortais que são tristes anelos./ Quando o pelicano, em longa viagem solta,/ Nas brumas da tardinha aos seus caniços volta,/ Famintos filhos seus caminham sobre a praia,/ Vendo-o esbater-se ao longe em cima às plúmbeas águas/ Já crendo em apanhar e repartir a presa/ Eles correm ao pai com gritos de alegrias/ Erguendo os bicos sobre as gargantas frias./ Ele, galgando a passos lentos uma rocha elevada,/ Em sua asa pendente abrigando a ninhada,/ Pescador melancólico, ele olha os céus./ O sangue corre em golfadas em seu peito aberto;/ Em vão dos mares escavou a profundeza:/ O Oceano estava vazio e a praia deserta;/ Por todo alimento ele traz seu coração./ Sombrio e silencioso, estendido sobre a pedra,/ Repartindo aos seus filhos suas entranhas de pai,/ No seu amor sublime embala a sua dor,/ E, olhando escorrer seu peito a sangrar,/ Sobre seu festim de morte ele se prostra e cambaleia,/ Ébrio de volúpia, de ternura e de horror./ Mas às vezes, no meio do divino sacrifício,/ Fatigado de morrer em tão longo suplício,/ Ele acredita que os filhos o deixem vivendo;/ Então soergue-se, abre sua asa ao vento,/ E, ferindo-se o coração com um grito selvagem,/ Solta dentro da noite um tão fúnebre adeus,/ Que os pássaros dos mares desertam a beira-mar,/ E que o viajor demorado na praia,/ Sentindo passar a morte, se recomenda a Deus.” (La Nuit de Mai (1835).
Ao findar este mês de maio em pleno outono, quis prestar uma homenagem in memoriam a este inigualável poeta romântico francês que com seu poema( inserido em Noites de Maio), demonstrou até onde vai o amor paterno e materno, sacrificando sua própria vida para que seus filhotes continuem a viver. É uma lição divina da natureza.
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Poeta e cronista - E-mail: rs080254@via-rs.net
Publicado em 28 de maio de 2003 - no Diário de Canoas.

http://ial123.blog.terra.com.br/

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