segunda-feira, 6 de julho de 2009

CONTO de IALMAR PIO

Jerônimo sonhando com a amada...




JERÔNIMO, O TÍMIDO

Ialmar Pio Schneider

Pensava que não tinha perspectivas quanto àquela paixão que nutria com tanta persistência. Por isto vivia frustrado ao lembrar-se de Paula, quando a via sentada à mesa de uma lancheria no shopping center Praia de Belas, juntamente com suas amigas, nos happy hours dos fins de tarde. Muitas vezes falara com ela, insinuando que a queria, mas não tendo coragem para declarar-se, sofria enormemente. Jerônimo era um tímido.
Desejava o amor carnal, enfim, total.
A mulher que povoava a sua cabeça era uma morena desenvolta, de cabelos negros e compridos, olhos pretos quais duas jabuticabas, lábios rubros que nem pétalas de rosa vermelha, seios palpitantes e firmes, braços roliços e torneados, cintura fina de vespa, nádegas de tanajura, coxas e pernas esculturais e os pezinhos de anjo ou demônio, fascinantes. O conjunto dela o atraía como se fosse um ímã; às noites sonhava que a possuía e acordava, por assim dizer, quase feliz. Durante o dia andava ao seu encalço só para admirá-la, mas não perdia a esperança de consegui-la. Era a sua paixão.
Procurando abafar aquele sentimento as 24 horas do dia, mas não o conseguindo, sentia-se como se estivesse deprimido. Entretanto, no fundo, alimentava esse anelo que guardava qual um precioso tesouro. Apesar de tantas vicissitudes, pensava consigo: um dia choverá em minha horta. Sabia que tinha que ter paciência, pois as coisas não se resolvem assim, sem mais nem menos, principalmente as do coração. Tivera conhecimento rudimentar do que seria um amor platônico, mas não queria que o seu o fosse e lutava por isso.
Às vezes, passeando pelas ruas da cidade, encontrava-se com os amigos, que sabendo de sua história, perguntavam-lhe: - “Como vai a Paula ? Nada ainda ? Tens que conquistá-la ! Ela está lá no shopping com as amigas...” Jerônimo respondia: - “Estou pensando numa maneira de chegar; está difícil. Parece que tudo conspira contra mim, até vocês, caçoando.” - e lá se ia, pensando na amada e com um leve sorriso, como a disfarçar a situação. “Haveria de ter um jeito...” - matutava.
Até que um dia, voltando para casa em uma lotação, teve uma idéia. Conservou-a, entretanto, por mais algum tempo, ansiando que amadurecesse. Era mister que tivesse esse mínimo de coragem para vencer a timidez que todo o envolvia como uma aura. Um psiquiatra lhe dissera em certa ocasião que ninguém nasce tímido; que a timidez se adquire e pode ser tratada. Nunca mais voltara ao consultório e preferira continuar com sua doença, apesar de tudo. Queria vencê-la, naturalmente. Esse era o seu desígnio.
O mês de dezembro ia em meio, aproximava-se o verão e o calor era insuportável. Fazia 34º à sombra e as pessoas andavam pachorrentas, buscando chegar onde tivesse ar condicionado. Em algumas casas de bairros de classe média crianças tomavam banho de mangueira, onde não houvesse piscina, e as que existiam estavam lotadas.
Jerônimo via que o ano estava chegando ao fim e ele ainda não havia tomado uma atitude quanto ao seu caso que ia se tornando crônico. Não se tratava mais de paixonite aguda. Era algo mais forte e vinha durando... durando... Certa noite, em seu quarto de solteiro, sentado à escrivaninha, pega a esferográfica e um bloco de papel de cartas e começa a escrever. Era o que deveria já ter feito, mas, antes tarde do que nunca. Finalmente estava pondo em prática a sua idéia amadurecida e ao terminar a folha, dobrou-a e colocou-a dentro do envelope, endereçando-o para: “Namoro na TV - Programa Sílvio Santos - SBT - São Paulo - SP”.
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Poeta e contista
Publicado em 9 de dezembro de 1998 - no Diário de Canoas.


Um comentário:

  1. RecHeureux, tu compteras des amitiés sans nombre, mais adieu les amis, si le temps devient sombre. Et il n'y a pas plus grand amour que de donner sa vie pour ses amis! De vous amis de tous jours! Pierre et Yvonne


    ebi de Paris o seguinte comentário:

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